sexta-feira, 17 de dezembro de 2010

Ode ao burguês. Ode a denarius !!!

Lembro quando a "Paulicéia Desvairada" mais uma vez se abria à meus olhos em 98, ainda na faculdade, Mário de Andrade em seu nono poema despertava-me novamente à revolta.
Posiciono o texto, o fato, a idéia e conteúdo, e questiono, quanta temporaneidade !
Posso cometer o erro interpretativo, mas afirmo a atualidade textual de seus versos expressada em nosso cotidiano.
“... Eu insulto o burguês! O burguês-níquel
o burguês-burguês!...
... Morte às adiposidades cerebrais!
Morte ao burguês-mensal!
Ao burguês-cinema! ...”
No momento seguinte, desnudado de pré conceitos e referenciais particulares, também concordava com a maioria, de que não se tratava de idéias antiburguesas, isto estava claro, mas a incitação e provocação causadas na primeira leitura colocava-os em senso comum.
Falamos em 22, na semana de arte moderna, Mário de Andrade, possuidor de vasta cultura e uma visão tridimensionalmente amplificada da sociedade paulistana da época, dirigia-se ao imigrante burguês, preocupado exclusivamente com o dinheiro, ao burguês burro, ateu, sem crenças e sem fé, onde as aparências valiam mais.
Ode a 2010, ao tempo presente, ao futuro que nos espera e que esperamos não esperar.
Ode a essa sociedade apodrecida pelos denarius acumulados em cérebros ocados.
Ode ao digitalismo da violência gratuita, a droga que droga também não é, aos tantos complexos, alemães, brasileiros, copacabanicos e ipanemicos.
A venda que venda os olhos da deusa roubada da face do cristo redentor, vendemos, estamos também vendados, de vendar, de vender-mos a qualquer preço.
Ode a nossa burguesia interneticamente inserida, quanta informação disfarçada de lixo intelectual.
Ode a gula, que devora os parcos cardápios dos famintos e as nobres cartas oriundas das videiras de secura humana. Ode aos Everardos. Ode aos templos de consumo supérfluo, passarelas de sei lá o que!
“... Eu insulto as aristocracias cautelosas!
Os barões lampiões! Os condes Joões!...
... Que vivem dentro de muros sem pulos,
e gemem sangue de alguns mil-réis fracos...”
Quanta temporaneidade !
Ode a Mario de Andrade, ode ao crítico que diz dizendo o que sabe dizer, em poesia, em verdade.
“... De mãos nas costas! Marco eu o compasso! Eia!
Dois a dois! Primeira posição! Marcha!
Todos para a central do meu rancor inebriante!
Ódio e insulto! Ódio e raiva! Ódio e mais ódio!...”
Evoco Pavlov, a quem sou profundo admirador, médico russo, apaixonado pela filosofia, que do alto de sua inteligência, de seus prêmios e Nobel, deveria estar divagando em risos quando desenvolvia uma de suas maravilhosas teorias, onde em vez de utilizar métodos subjetivos de pesquisa, era por meio do estudo das inter-relações entre homem e meio externo que posteriormente iria desenvolver o famoso princípio do condicionamento humano.
Somos maravilhosamente treinados ao consumo, condicionados ao gasto ilimitado, construímos parâmetros milimetricamente definidos em balizadores do eu quero, eu posso, eu compro, eu tenho, você não tem!
De que vale minha capacidade de ler, interpretar, de que vale minha capacidade de escrever.
De que vale minha inteligência? Se faltei ao dia da aula de condicionamento, da aula que ensina a sermos condicionados á riqueza material. De que vale ser quem sou?
Talvez eu valha, para Mário, ser eu, um não burguês-burguês, um não pobre alienado!
Talvez eu valha pra mim mesmo, algo não material, não valor, não colecionável, não cumulativo, talvez eu valha, aquilo que para vocês não vale nada!